sábado, 19 de setembro de 2015

Violeta [pessoa]...




Chama-se Violeta e tem 20 anos. O nome traz-me de imediato à memória aquela miúda cantora tão na moda. Diferem na idade. É hiv. Não faço perguntas. Não estou aqui para perguntar nada, sou paga para ouvir, cuidar e encaminhar. 

Enquanto falamos, gesticula. Observo-lhe as mãos de unhas de verniz a sair e encardidas por baixo da cor que já não tem. Está suja. Toda ela suja. Roupa suja, pele suja. Mostra-me uma ferida numa mão, infectada sem dúvida nenhuma. Com conteúdo seroso que purga. Faço-lhe um pequeno penso imediato para não sair dali a contaminar tudo onde toca. Puxadores de portas, paredes, cadeiras da sala de espera e etc etc. Conversamos mais um pouco sobre o mecanismo de lesão da ferida, ao que me diz que foi mordida por um cão há já cinco dias e não ligou. Encaminho-a para a pequena cirurgia. Levanta-se da cadeira a abanar na mão a chave de um carro. 

Olho-a novamente. Mais atentamente. É bonita. Tem uns olhos bonitos mas está tão suja. E cheira a corpo sujo. Sinto pena de alguém tão novo que é totalmente incapaz de cuidar de si. De se olhar ao espelho e perceber o que lhe falta. Falta de higiene revela sempre falta de auto estima. E não me venham com histórias que é por se ser pobre. Ser pobre não é sinónimo de se ser sujo ou ter falta de brio em si mesmo. A minha avó que viveu todas as dificuldades de uma geração pós segunda guerra mundial, com falta de quase tudo, dizia do alto da sua sabedoria, "pobrezinho mas limpinho" com um orgulho imenso na sua pobreza asseada. 

Sou arrancada às minhas parvas considerações pelo meu colega Pedro:
O que é que queria essa badalhoca?

12 comentários:

  1. Tens toda a razão quando escreves isto AC: "Ser pobre não é sinónimo de se ser sujo ou ter falta de brio em si mesmo. A minha avó que viveu todas as dificuldades de uma geração pós segunda guerra mundial, com falta de quase tudo, dizia do alto da sua sabedoria, "pobrezinho mas limpinho" com um orgulho imenso na sua pobreza asseada."

    A minha avó costuma contar que a avó dela também dizia o mesmo "pobrezinho, mas limpinho". Infelizmente, a questão do teu colega apenas reflecte o julgamento que as pessoas na sua generalidade gostam de fazer uns aos outros. Não percebo a razão de tal acontecer. Não sei o que ganham com isso.

    Um beijinho!

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    1. Alexandra: invariavelmente acaba sempre por se fazer observações, não necessariamente julgamentos. Confesso que eu mesma lido muito mal com a falta de higiene e que acabo sempre por associar a sujidade de uma pessoa à sua falta de auto estima, acho que ambas estão interligadas. E quando a falta de higiene acontece em gente muito nova, com mobilidade, e plena das suas faculdades, custa-me ainda mais.

      Beijinho Alex.:))

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    1. L´Enfant Terrible: Cada um sabe de si... ela lá saberá das suas razões, mas que incomoda os outros incomoda.

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  3. Ninguém conhece a vida de ninguém, nem mesmo quem pensa que conhece. Portanto, nada de julgamentos... pois certamente ninguém gosta de ser julgado!

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    1. Gata: A nossa liberdade termina onde começa a dos outros. Quando o cheiro incomoda quem está ao nosso lado só não se sente quem não tiver olfacto... mesmo que seja sem julgamentos!

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  4. Gostei. Sem comentários. Cada um que julgue por si. As palavras também servem para despistar:) Para enganar se for necessário:)
    Falta o "cheiro" na tua cronica. Mais do que o "sujo" o cheiro é ainda mais marcante numa pessoa.
    Gosto do "cheiro" das tuas palavras
    um abraço do
    Joaquim

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    1. Joaquim: É difícil passar para a escrita o que vivo diariamente, ainda para mais eu que não sou nenhuma eximia contadora de histórias. Tento... este é só um ensaio, uma sebenta de relatos.

      Beijinho Joaquim

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  5. As tuas histórias ás vezes fazem-me lembrar os retalhos da vida de um médico...

    Bom dia ou boa noite miúda depende da hora a que me leres e uma semana cheia de sol e de mommentos bons para ti miúda:) jinhoooooossssssss

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    1. Suricate: Se eu pudesse aqui contar tudinho, muito mais havia para relatar. Algumas historietas para rir, outras para chorar, mas há coisas que guardo para mim... ou porque deixam marca ou porque são casos específicos e identificáveis no conteúdo.

      Beijinhoooo Suri:)

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  6. A badalhoca quer carinho e respeito.

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Diz aí nada ou coisa nenhuma.